quinta-feira, 22 de abril de 2010

Querido diário,


Preciso te contar uma coisa, ganhei um piano de calda. Ele já estava encomendado fazia 2 meses, seria o presente das meninas para mim. Quando ele chegou, eu realmente pensei em devolvê-lo mas uma voz me falou para ficar com ele. A voz da Flávia. Eu senti um arrepio e foi como se por um momento eu voltasse a pertencer a algum lugar.

Quando sentei no piano, foi mágico ! Revivi todos os meus momentos felizes com o som de River Flowrs in Your, a músicas que eu sempre tocava quando nós estávamos reunidas aqui em casa. Eu sentia as lágrimas caindo nas minhas bochechas, mas elas não eram as lágrimas que agora costumam cair no meu rosto, eram lágrimas de felicidade porque eu enfim tinha reencontrado o meu lugar. Eu sabia que não parecia nada para quem me ouvisse tocar, mas para mim, era como se nada tivesse acontecido e eu estivesse tocando piano dentro de uma bolha de felicidade.

Ontem meus pais vieram falar comigo. Nós fomos jantar só eu e eles, sem o meu irmão. Eles me perguntaram o que eu senti quando toquei piano e eu contei a eles. Então veio a grande surpresa: eles me deram uma viagem para uma escola de música na Itália durante 6 meses! Eu não acreditei quando eles me disseram, mas a felicidade também foi passageira. Será que eu estou pronta para Viajar de novo ? Dessa vez sozinha ? O único motivo para mim não ter tentado suicido ainda foi a minha família, e ficar longe deles pode ser até perigoso. Não decidi ainda se quero ir e a minha mãe até se propôs a ir comigo, mas não quero que o meu irmão e o meu pai fiquem sem ela aqui entende ?

Eu ainda não sei o que fazer. Não quero viver só dessas felicidades passageiras, eu quero o meu lugar mas quanto mais eu procuro, mais me machuco. Na verdade, eu não sinto falta do lugar, eu sinto falta das pessoas que estavam comigo, então ficar aqui, onde costumava ser o meu lugar, deve ser um erro porque só me traz mais lembranças.

Sabe o que isso me fez perceber ? Me fez perceber que eu devo ir para Itália. O meu lugar era aqui, e talvez o meu novo lugar seja la.


Vou arriscar. Afinal, já perdi o que eu mais amava. Minhas amigas.

terça-feira, 13 de abril de 2010

Querido Diário,
Já faz três meses. Eu não escrevi mais depois de ter te contado. Não tive coragem. Parece que tudo nunca vai acabar. Nem a dor, nem a saudade.
Ontem eu voltei a escola, o clima era de luto e eu não consegui conter as lágrimas. Quando eu olhei a classe, faltava alguma coisa, faltava algumas pessoas. Ninguém sentou no lugar onde nós nos sentavamos. Nem mesmo eu. Preferi sentar no fundo para poder enxugar minhas lágrimas discretamente.
Eu senti tanta falta delas. Esses três meses trouxe o peso de uma vida inteira. O pior é saber que não importa quanto tempo passe, elas não vão voltar. Eu nunca mais vou ver a Flávia, ou abraçar a Lú. Nunca mais vou poder ouvir a risada da Natália. Nunca mais.
Desde a viagem não encontro mais meu lugar. Nem mesmo a minha casa parece me acolher do mesmo jeito. Desde que cheguei e desde que tudo aconteceu recebi algumas ligações, algumas visitas, ombros para chorar, pessoas tentando me animar, mas isso foi só no primeiro mês, depois de um tempo, ninguém passou a ligar mais, todo mundo seguiu sua vida. Menos eu.
Há uns quinze dias, eu fui com minha mãe no supermecado e vi uma barra de Laka, o chocolate preferido da Lú. Ela era viciada nesse chocolate e eu sempre comprava uma barrinha pra ela. Por que as lembranças doem tanto? Antes eu saía para todos os lugares e achava graça quando lembrava delas, mas agora só sinto dor e saudade.
Será que um dia vou reecontrar o meu lugar? Eu era tão segura das coisas quando elas estavam comigo, e hoje, pareço uma personagem patética de um filme ruim. A Lú com certeza saberia o que dizer. Ela sempre sabia. Ela sempre cuidava de mim. Ela conseguiria me acalmar e eu acreditaria que tudo ia ficar bem se ela disesse. Mas ela nunca mais vai dizer isso. E eu nunca mais vou ouvir ela me dizer que tudo ficará bem.
Por que o furacão aconteceu? O que nós fizemos para merecer isso? Não gosto de imaginar como elas devem ter ficado assustadas. Será que na hora se lembraram do que eu havia dito? Será que ficaram com raiva de mim? Afinal, a culpa é minha.
Minha vida parecia um conto de fadas e agora é como um pesadelo do qual eu não consigo sair. Eu escapei da morte, mas na maior parte, preferia ter morrido. Nunca fui boa em despedidas, mas não ter tido nem a chance de me despedir foi uma grande crueldade do destino. Por que será que isso aconteceu? Será que vai trazer alguma coisa boa para a minha vida? Porque se for, eu não quero nada. Só as minhas melhores amigas de volta.

quinta-feira, 1 de abril de 2010

O furacão acabou com tudo que havia lá. Estava relendo as primeiras páginas antes da viagem, antes mesmo de pegar o avião. Eu estava tão animada! Todas nós estavamos.Só o fato de pensar em ir só entre amigas para essas praias tão lindas, já me fazia arrepiar todos os pêlos do braço só de emoção.Nunca imaginei que isso poderia acontecer.
Lembro dos primeiros dias em que nós estavamos tomando sol, brincando no mar, comendo aqueles chocolates que eles deixam em cima dos travesseiros.Estava tudo perfeito, tudo melhor do que o planejado. Até que aconteceu. Lembro como se fosse hoje, como se o tempo tivesse congelado, como se fosse um sonho. Sonho não, pesadelo.
Antes de viajarmos, meu primo estava fazendo um trabalho sobre desastres naturais, e ficou ótimo. Eu li e reli o trabalho de tão interessante que estava.
No quinto dia no paraíso, eu percebi que o tempo havia mudado, os pássaros estavam agindo diferentes, é como se eles estivessem saindo da cidade apressados. Eu sabia o que era aquilo, mas não era especialista e não queria acreditar. Eu sabia que alguma coisa ruim ia acontecer.
Um sexto sentido me falou para sair dali, e eu não discuti com ninguém sobre isso. Esperei.
Á noite, chamei as meninas e decidi contar a elas. Acharam que eu estava bêbada, ou brincando, me deixaram tão irritada que eu decidi ligar para os meus pais e ir para casa. Saí antes que elas acordassem, mas tropecei em um sapato e acabaei caindo, acordando a Natália. Ela deve ter visto o medo em meus olhos, sem nenhuma palavra, ela me abraçou e sorriu como se soubesse o que estava por vir. Voltou a dormir. Eu não entendi nada, mas não deixei isso me atrapalhar, fui para o aeroporto e embarquei.
No avião eu só imaginei se elas me perdoariam por deixá-las lá. "Claro que me perdoariam, são minhas melhores amigas " Só isso me consolava.
Quando cheguei ao Brasil, só queria abraçar minha mãe, meu pai, meus irmãos e meus cachorros, era como se eu quase tivesse perdido eles. Estava feliz de estar em casa.
Três dias depois, recebi uma notícia, a pior que podia receber. Um furacão acabou com a cidade onde ficava o hotel que estavamos hospedadas. Estavam á procura de sobreviventes, mas não foram muitos. O desespero me atingiu, eu devia ter obrigado elas a voltarem. Eu sabia o que ia acontecer lá. Era tudo culpa minha.
Alguns dias depois, os corpos de todas haviam sido encontrados, menos o da Natália que dois dias depois foi encontrado no mar. Eu não conseguia sair debaixo das cobertas, não dormia, não comia. Só pensava no quanto fui culpada. Hoje quando finalmente resolvi fazer alguma coisa, achei uma carta da Natália. Minha mãe tinha achado dentro de uma das minhas malas. A carta foi escrita no dia em que eu contei a elas sobre meu pressentimento.A carta dizia:
"Liza,
eu sei o que vai acontecer, e acredito em você. Mas não vou voltar, porque não vejo jeito melhor de morrer a não ser com minhas melhores amigas. Você deve estar se culpando pelo que aconteceu, mas a culpa não foi sua. Nunca vai ser. Você só tem que se lembrar que nós te amamos e nós vamos estar com você sempre.
AMIGAS PARA SEMPRE. "